segunda-feira, 15 de fevereiro de 2016

Einstein acertou: cientistas provam que ondas gravitacionais existem


Detecção acontece pouco mais de cem anos após publicação da Teoria da Relatividade Geral pelo físico


Por CESAR BAIMA

Ondas gravitacionais geradas por colisões de buracos negros foram observadas pela primeira vez pelo LIGO – Divulgação de vídeo do LIGO

RIO — Última das principais previsões da Relatividade Geral de Albert Einstein que ainda não tinham sido observadas diretamente, as ondas gravitacionais foram finalmente detectadas, provando mais uma vez a correção da teoria publicada pelo físico de origem alemã há pouco mais de cem anos. Após meses de rumores na comunidade científica, que ganharam ainda mais força nas últimas semanas, pesquisadores do experimento Ligo (Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferometria a Laser, na sigla em inglês), nos EUA, anunciaram ontem em uma conferência em Washington que seus equipamentos registraram a passagem dessas distorções no espaço-tempo pela Terra em 14 de setembro último, o que deverá representar uma nova era na astronomia e cosmologia.

— Senhoras e senhores, nós detectamos ondas gravitacionais. Conseguimos! — comemorou David Reitze, pesquisador do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e diretor-executivo do Ligo. — Esta é a primeira vez que o Universo fala conosco por meio de ondas gravitacionais. Ao abrirmos essa nova janela para a astronomia, poderemos ver coisas que nunca vimos antes.

Processo que mostra a colisão de dois buracos negros, o que acontece em pouquíssimos segundos - Divulgação/LIGO

         Elaborada para explicar como funciona a gravidade, a Relatividade Geral diz que toda massa distorce a estrutura do espaço-tempo à sua volta, deformações geralmente ilustradas, de maneira simplificada, como uma bola de boliche pousada em uma cama elástica, e que sentimos como uma força atrativa. Mas como nada no Universo é estático, a movimentação de qualquer objeto provoca oscilações no tecido do espaço-tempo que se espalham a partir dele como uma pedra atirada em um lago, que são as chamadas ondas gravitacionais.

50 vezes a energia de todas as estrelas
Estas oscilações, no entanto, são muito pequenas. Assim, para as ondas gravitacionais serem detectadas, pelo menos com a tecnologia disponível atualmente — e inexistente na época de Einstein —, é preciso, primeiro, que elas sejam geradas por objetos extremamente maciços se movendo muito rápido. E foi exatamente isso que o Ligo observou.
Segundo os cientistas, o sinal captado — com uma frequência que começou em 35 ciclos por segundo (hertz) e rapidamente subiu para 250 hertz, e por isso foi equiparado ao “pio” de um passarinho — foi provocado pela fusão de dois buracos negros, um com cerca de 36 vezes a massa do Sol e outro com 29 massas solares, que colidiram a uma velocidade equivalente à metade da luz em uma galáxia distante, há estimados 1,3 bilhão de anos. Dessa união resultou um novo buraco negro com 62 vezes a massa do Sol, com as três massas solares faltantes convertidas em uma fração de segundo na energia que alimentou a emissão das ondas gravitacionais, num total que, neste breve período de tempo, ultrapassou em 50 vezes a energia liberada por todas as estrelas do Universo juntas.
Apesar de todo este poder na sua origem, os efeitos da passagem das ondas gravitacionais pela Terra foram ínfimos. Isso porque, assim como as ondas geradas pela pedra no lago vão diminuindo de tamanho à medida que se afastam do ponto de impacto, essas oscilações no espaço-tempo perderam “força” ao percorrerem os 1,3 bilhão de anos-luz que nos separam do agora único buraco negro. Assim, durante uma fração de segundo, elas esticaram e espremeram o espaço-tempo no nosso planeta em apenas uma parte em um sextilhão, no equivalente à largura de um simples núcleo atômico.
E essa variação tão pequena só pôde ser detectada graças à incrível sensibilidade do Ligo. Idealizado pelos físicos americanos Rainer Weiss, do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), Kip Thorne, do Caltech, e o escocês Ronald Drever, hoje aposentado, mas anteriormente associado ao instituto californiano — e todos eles desde já considerados fortes candidatos a receberem um futuro Prêmio Nobel de Física, se não ainda este ano muito em breve —, o experimento é, na verdade, composto por dois observatórios instalados nos estados americanos de Washington e Louisiana, cerca de três mil quilômetros distantes um do outro.
Construídos a um custo de mais de US$ 1,1 bilhão (cerca de R$ 4,4 bilhões) a partir dos anos 1990 pela Fundação Nacional de Ciência dos EUA (NSF), nestes dois observatórios potentes lasers com comprimento de onda extremamente curto batem e voltam constantemente em espelhos colocados nas extremidades de dois corredores de aproximadamente quatro quilômetros de comprimento cada, erguidos em forma de “L” e cuidadosamente protegidos de vibrações externas. Em situações normais, esses dois raios de luz se anulam ao se encontrarem no “canto” do “L”, num processo conhecido como interferometria. Mas, quando uma onda gravitacional passa por eles, um dos “braços” do “L” fica ligeiramente mais curto ou longo que o outro, e parte da luz “vaza” para atingir um detector. Com isso, os dois observatórios podem medir variações no comprimento dos corredores por essas oscilações no espaço-tempo com uma precisão de um décimo de milésimo do diâmetro de um próton.

Uma nova era na astronomia
Mais que provar, novamente, que Einstein estava certo, porém, a detecção das ondas gravitacionais promete abrir novos caminhos para as pesquisas em astronomia e cosmologia. Até hoje, por exemplo, alguns teóricos, embora poucos, duvidavam da possibilidade da existência de buracos negros — ideia que inclusive não agradava e chegou a ser rechaçada pelo famoso autor da Relatividade Geral —, o que agora foi definitivamente comprovado, já que nenhum outro par de objetos poderia concentrar tanta massa em tão pouco espaço e se comportar da maneira como os dois cuja fusão foi observada pelo Ligo.
— A importância desta detecção vai além do que podemos prever, pois acaba de nascer um novo campo da ciência — destaca a astrônoma brasileira Duilia de Mello, professora da Universidade Católica da América, nos EUA, e pesquisadora do Centro de Voo Espacial Goddard, da Nasa. — Já estudamos a teoria de ondas gravitacionais há muito tempo, mas só hoje (ontem) é que esta teoria virou realidade. Só hoje (ontem), quando os cientistas do Ligo mostraram os sinais observados, que a comunidade científica respirou aliviada. Agora estamos prontos para inventar, inovar e transformar a ciência e a tecnologia mais uma vez. Já pensou quanta coisa importante está por ser descoberta que antes não conhecíamos? Agora que podemos ouvir buracos negros se chocando, podemos sonhar em ouvir muito mais e entender melhor fenômenos que nos deixam sempre perplexos e que fazem parte da história do Universo.




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