Desde o filósofo grego Empédocles até os dias atuais, a luz é objeto de
estudo
O que ocorre nos
olhos que nos permite ver? A informação que vemos sobre o mundo vem de fora ou
está dentro dos olhos? A visão depende da luz? Afinal, o que é a luz? Uma onda?
Uma partícula?
Essas foram questões
que dividiram filósofos e cientistas por mais de 2 mil anos. Entre os gregos
antigos, havia várias teorias para tentar explicar a luz e a visão. Os
primeiros questionamentos nesse sentido foram algo como ‘Os homens enxergavam
porque algo saía dos olhos ou porque algo entrava nos olhos?’ Primeiramente,
acreditou-se que a visão era resultado de raios emitidos pelos olhos.
No século 5 a.C., o
filósofo Empédocles, que postulou que tudo era composto de quatro elementos
(terra, fogo, água e ar), foi um dos mais influentes em sua época sobre a
questão da luz. Ele acreditava que o olho humano havia sido feito por Afrodite
e que essa deusa da beleza e do amor havia acendido o fogo dentro desse órgão.
Portanto, era essa luz emitida pelos olhos que permitia a visão.
Para Empédocles, esse
fogo interno “tocava” os objetos e, ao retornar para a pupila, trazia
informações sobre eles, como se fossem tentáculos. Por sua vez, os objetos
também emitiam um tipo de fogo que carregava suas informações, como a cor e a
forma. Assim, o fenômeno da visão ocorria quando o fogo interno dos olhos
entrava em contato com o fogo externo dos objetos.
Mas a teoria de que a
luz emanava dos olhos deixava questões em aberto: por que não é possível
enxergar num lugar escuro? Que relação tem a luz do dia com o fogo emitido
pelos olhos?
O matemático
Euclides, famoso por seu livro sobre geometria, questionou-se sobre a natureza
da luz. Ele se perguntava como era possível fechar os olhos, à noite, e, ao
abri-los, ver imediatamente a luz das estrelas distantes? Para ele, isso só
seria possível se a luz emitida pelos olhos viajasse com velocidade infinita.
As ideias de
Empédocles sobre a luz foram criticadas pelos atomistas, filósofos que
acreditavam que as coisas eram feitas de diminutas partículas, os átomos.
Lucrécio, por exemplo, escreveu, em 55 a.C., que a luz e o calor do Sol eram
compostos de átomos, que, assim que disparados, viajavam, sem perder tempo
algum, através do ar. Para os atomistas, os objetos emitiam átomos em todas as
direções e entravam nos nossos olhos, produzindo a visão.
Porém, a teoria
atomista não explicava outros tantos questionamentos: as partículas
desprendidas de um objeto não se chocavam contras as do objeto? Elas passariam
umas pelas outras sem interagir? Como a imagem de um objeto muito grande
encolheria para caber nos olhos?
O matemático árabe Alhazen (Foto: Reprodução TV)
A hipótese de que
algo saía dos olhos foi duramente criticada pelo matemático e astrônomo árabe
Alhazen – também conhecido como Ibn Al-Haytham –, que viveu no século 10 da era
cristã. Para Alhazen era absurdo supor que uma emanação fluindo do olho seria capaz
de preencher os céus visíveis quase simultaneamente ao levantar de nossas
pálpebras.
Para ele, uma das
propriedades da luz é afetar o olho, e é uma propriedade da visão ser afetada
pela luz. A sensação visual, portanto, só é adequadamente explicada em termos
da luz que chega aos olhos, vinda de um objeto. Num pensamento semelhante ao
dos atomistas, Alhazen defendeu que a luz solar era feita de diminutas
partículas que viajavam em linha reta, com grande velocidade, mas finita, e que
eram refletidas pelos objetos para dentro de nossos olhos. Alhazen estudou não
só a reflexão da luz pelos corpos, mas também a passagem dela por eles,
fenômeno chamado refração.
Pelo conjunto de sua
obra, reunida nos sete volumes do livro Óptica, publicado em latim em 1270, Alhazen
é considerado, por muitos estudiosos da cultura árabe, como o primeiro físico
experimental da história. Isso porque ele usou a câmara escura para estudar os
fenômenos luminosos e provar suas ideias, principalmente a de que eram os
objetos que emitiam luz e não os olhos.
Quase seis séculos se
passaram até que surgisse uma contribuição importante para o entendimento dos
fenômenos ópticos. Isso foi feito pelo astrônomo alemão Johannes Kepler. Em seu
livro A parte óptica de astronomia, de 1604, considerado um dos marcos da
óptica moderna, ele explica a formação da imagem no olho e apresenta uma teoria
matemática para explicar o funcionamento de uma câmara escura. Também explicou
problemas de visão, como a miopia (dificuldade de enxergar de longe) e a hipermetropia
(de perto).
Kepler afirmou que a
imagem do objeto observado é formada na retina – e não na lente do olho, o
cristalino, como acreditava Alhazen. Mas não se perturbou com o fato de que a
imagem aparecesse de cabeça para baixo nessa parte ao fundo do olho.
Em 1611, em outra
obra importante, Dioptrica, Kepler, para quem a velocidade da luz era infinita,
traça as bases das leis da passagem da luz através de um sistema de lentes. Ele
mostra, por exemplo, como duas lentes convexas podem tornar os objetos maiores,
embora invertidos. Esse é o princípio usado nos telescópios astronômicos.
Mas qual a
importância de Kepler para o entendimento dos fenômenos ópticos?
René Descartes (Foto: Reprodução TV)
A história do
pensamento sobre a natureza da luz pode ser dividida em duas correntes: 1)
aqueles que defendiam ser a luz uma onda e 2) os que acreditavam se tratar de
um corpúsculo. Como vimos, os atomistas e Alhazen eram adeptos desta última,
sendo que a teoria corpuscular foi retomada por pensadores no século 17, como o
francês Pierre Gassendi. Já a visão da luz como sendo uma onda teria adeptos de
peso, como o filósofo e matemático francês René Descartes e o inglês Robert
Hooke, que viveram no século 17.
Descartes defendia
que o espaço era preenchido com algo que ele chamou de ‘plenum’, que transmitia
pressão da fonte de luz até os olhos. Portanto, não era uma coisa material –
partícula, átomo ou fogo – que realmente se deslocava de uma fonte luminosa até
o olho.
Adepto de Kepler,
Descartes apelou para um experimento bizarro para comprovar o argumento do
astrônomo alemão de que a imagem se formava na retina de cabeça para baixo.
Olhou através de um olho de boi do qual havia arrancado a retina e viu que a
imagem realmente era invertida.
Descartes, para quem
a velocidade da luz era finita, dedicou-se a um dos problemas mais difíceis até
então da óptica: a refração, ou seja, a passagem da luz de um meio para o
outro, como do ar para a água. Ele apontou a forma de calcular o desvio que ela
sofre nesse processo. Além disso, ele tentou explicar o arco-íris.
Influenciado pelas
ideias de Descartes, o matemático e físico holandês Christiaan Huygens
desenvolveu uma teoria baseada na concepção de que a luz seria uma onda que se
propaga pelo éter, um meio que, segundo os filósofos antigos, permeava todo o
espaço. Isso o fez discordar de aspectos da teoria sobre luz e cores de Isaac
Newton, baseada numa concepção corpuscular da luz. Para Huygens, a luz se
comportava como uma série de ondas, que transmitiam o movimento de uma a outra
– como a transferência de movimento de uma bolinha a outra.
Com sua teoria
ondulatória da luz, Huygens explicou satisfatoriamente vários fenômenos
ópticos, como a propagação retilínea da luz, a refração e a reflexão. Para ele,
a luz se propaga com velocidade enorme, mas finita. Seus estudos podem ser
consultados em seu mais conhecido trabalho sobre o assunto, o Tratado sobre a
luz, de 1690. A teoria ondulatória de Huygens, no entanto, foi eclipsada pela
teoria corpuscular de Newton, que prevaleceu ao longo de todo o século 18. A
fama e o alcance das ideias desse cientista inglês desempenharam um papel
essencial nessa preponderância.
O físico inglês Isaac
Newton defendeu a teoria corpuscular da luz. Ele foi influenciado pelas ideias
do atomista Gassendi. Essa visão causou grande controvérsia com outro cientista
inglês, igualmente influente, Robert Hooke, que, poucos anos antes, havia
publicado sua teoria ondulatória da luz. As ideias de Newton, no entanto,
prevaleceriam, disseminadas pelo século 18 por seus seguidores.
No final do século
19, no entanto, a concepção ondulatória da luz passou a ser predominante.
Agora, a luz visível era apenas um dos vários tipos de ondas eletromagnéticas,
que podem viajar no espaço sem qualquer matéria que sirva de suporte para elas.
Diferentemente do som, a luz pode viajar no vácuo, com uma velocidade de 300
mil km por segundo, o que permite a ela dar várias voltas em torno da Terra em
um piscar de olhos. A velocidade da luz é um limite na natureza.
Albert Einstein (Foto: Reprodução TV)
O resultado de um
experimento publicado pelo inglês Thomas Young foi fundamental para o
estabelecimento da visão ondulatória da luz. No chamado experimento da dupla
fenda, a luz, depois de atravessar dois orifícios muito pequenos feitos sobre
um obstáculo, incide sobre um anteparo, formando nele um fenômeno que é típico
das ondas: a interferência.
Foi o físico alemão
Albert Einstein, no início do século passado, que, mais uma vez, inverteu esse
cenário. Ele demonstrou que a luz é formada de partículas, diminutos pacotes de
energia, denominados fótons. No final da década de 1900, Einstein perceberia
que o entendimento de vários fenômenos naturais só seria completo se a luz
fosse entendida como sendo tanto uma onda quanto um corpúsculo.
A confirmação final
sobre a realidade física do fóton foi obtida apenas na metade da década de
1920. Um dos experimentos que comprovaram a existência dos fótons foi feito
pelo físico norte-americano Arthur Compton. Nele, Compton demonstrou que,
quando um fóton colide com um elétron, ambos se comportam como partículas.
Em meados da década
de 1950, já no final de sua vida, Einstein costumava dizer que qualquer um
achava saber o que era o fóton. Mas, na verdade, as pessoas não sabem. Porque a
natureza do fóton ainda continua um mistério.
Afinal, o que é a luz?
Fonte: GLOBO CIÊNCIA
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