sábado, 23 de janeiro de 2016

A Nova Química Revive uma Questão Elementar


A Tabela Periódica é um símbolo público da Química. Porém, à medida que vai ela aumentando de tamanho, devemos mais ainda salientar que não é função da Ciência produzir listas, disse Philip Ball.

             
              Raramente a Química desfruta do fato de ser o centro das atenções, como o foi nas últimas semanas. O anúncio feito pela União Internacional de Química Pura e Aplicada (IUPAC) que de que a sétima linha da tabela periódica foi preenchida por meio da descoberta de quatro elementos químicos criados artificialmente (113, 115, 117 e 118) tem gerado um amplo debate público. Como serão chamados? Que propriedades químicas que têm esses elementos? A tabela periódica pode ser ainda mais alargada?
            Esta recepção entusiástica é certamente muito benéfica para a Química. Mas raramente, também, uma descoberta científica tão festejada possui tão poucas implicações no campo da pesquisa científica. O anúncio da IUPAC não é sobre a descoberta como tal, mas sobre a avaliação desse organismo que reivindica o agrupamento dos elementos e que julga as perguntas feitas anteriormente. No mundo todo, a rede de laboratórios bem equipada e que tem a árdua tarefa de “fabricar” novos elementos só exigia o selo de aprovação da IUPAC quando tinha certeza das propriedades do novo elemento.
            Cada novo elemento superpesado descoberto suscita questões interessantes, por exemplo: se existe uma região, na qual a estabilidade nuclear é aumentada ao invés de diminuir com o aumento da massa e se os efeitos relativísticos do movimento ultra-rápido dos elétrons distorce os padrões repetidos das propriedades na tabela. Há muito, o que se comemorar e estudar.
            Ernest Rutherford considerou uma grande piada ter ganho o prêmio Nobel de 1908, por explorar o decaimento radioativo, na área de Química - uma tentativa, dizem alguns, de trazer a ciência nuclear de volta para a Química após os trabalhos de Marie e Pierre Curie sobre radioatividade ter sido premiado com o Nobel de Física de 1903.
            A questão mais profunda é: por que as pessoas estão interessadas nas implicações que os novos elementos químicos podem provocar no estado da própria tabela periódica. A sistematização dos elementos tornou-se um ícone para a Química como um todo. No entanto, os químicos raramente precisam se referir à ela, e a maioria deles trabalha com alguns dos elementos químicos mais comuns.
            Vale dizer que a tabela periódica tem mais interesse e glamour para o público do que para o profissional da Química. Isso é estranho: parece abrir uma brecha entre o que muitas pessoas pensam sobre a Química (estudo dos elementos) e o que a maioria dos químicos fazem (moléculas e materiais e investigam suas propriedades e interações).
            No entanto, nada sobre isto é original. A tabulação ou enumeração de fundamentos também são feitas na física (partículas do modelo padrão) e na biologia (código genético, listas de genes e taxonomia). Estes esquemas de classificação despertam a consciência popular, de modo que à física atribui-se a descoberta de novas partículas (bóson de Higgs, partículas de matéria escura e assim por diante) e à biologia a identificação de 'genes' para certas características biológicas.
            O desafio para os químicos, então, é encontrar uma maneira de capitalizar sobre o fascínio e a coerência da tabela periódica, evitando a impressão de que de alguma forma possa contar a história de suas pesquisas.
            Este enfoque acrescenta peso à questão de como os novos elementos serão nomeados. Parece uma pena que o provincianismo e nacionalismo, muitas vezes próximos do chauvinismo, do passado (ver germânio, frâncio, escândio, amerício e várias permutações na cidade sueca de Ytterby) provavelmente irão persistir. (já foi amplamente divulgado que 'Japônio' será o nome do elemento 113, porque a prioridade de sua descoberta foi atribuída a uma equipe do instituto de pesquisas japonês RIKEN). Por que então não aproveitar a oportunidade para despertar a imaginação, em vez de plantar uma bandeira?
            Seria interessante ter um elemento chamado levium, após o escritor e químico Primo Levi. Seu livro Tabela Periódica (Einaudi, 1975) continua a ser o melhor livro já escrito sobre a Química, e agradaria ao meu senso de ironia ver um elemento superpesado com um nome que poderia ser interpretado como uma referência à leveza.
            No entanto, isto não trata-se apenas sobre leviandade. As estórias contadas por Levi sobre o seu tempo no campo de concentração de Auschwitz. Se este é um homem, de 1947, é uma das obras mais profundas e humanas do século XX, testemunhando o fato de que a Ciência pode ser uma força libertadora, universal para a salvação, embora deve-se reconhecer que o seu potencial pode ser para ser abusado de maneiras terríveis. O Levium significaria que a tabela periódica é para toda a humanidade.
Richard Haughton
Nature, Vol. 529p. 129 (14 January 2016) doi:10.1038/529129a


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