Por: Sofia Moutinho (Ciência Hoje On-line)
Método para identificar galáxias,
estrelas e planetas distantes é adaptado para a detecção de tipos graves de
câncer de mama. A 'troca de figurinhas' entre astrônomos e médicos ajuda no
encaminhamento para o tratamento adequado.
Na esquerda, foto de células de câncer tratadas com
reagente pronta para ser submetida ao programa. Na direita, o objeto comum dos
astrônomos: espaço sideral repleto de estrelas, planetas e galáxias. (fotos:
Simon Shears | M. Kornmesser/ ESO)
Uma
técnica usada para identificar gigantescos objetos astronômicos fotografados
por telescópios agora pode ser aplicada na detecção de minúsculas células
cancerosas vistas através de microscópios. A ideia da interessante troca é de
pesquisadores da Universidade de Cambridge, na Inglaterra.
Os
cientistas do Centro de Pesquisa de Câncer e do Instituto de Astronomia da
instituição formaram uma parceria para adaptar um programa de análise de
imagens que identifica galáxias, estrelas e planetas no céu para ele passar a
apontar células de tumores de câncer de mama agressivos.
Existem tumores de diferentes níveis de severidade e a identificação do estágio exato em que se encontram ajuda a direcionar o tipo de tratamento mais adequado em cada caso. Os cientistas conseguem saber se um câncer é de categoria agressiva pela presença de determinadas proteínas que a célula tumoral produz. Hoje, a detecção dessas proteínas é feita pela visualização de amostras em microscópios, um processo que pode tomar muito tempo.
Com
o programa, a identificação dos tumores é automatizada e mais de 5 mil imagens
podem ser analisadas por dia
O
programa de astronomia adaptado faz esse trabalho de modo automático e mais
rápido. Os cientistas só precisam jogar sobre as amostras de tumor uma
substância que reage com as células e deixa uma mancha marrom onde há a
proteína que procuram. Feito isso, basta deixar que o software processe
fotografias das amostras e identifique, sozinho, as células marcadas.
“A
medicina moderna está dando os primeiros passos no sentido de prever o sucesso
ou a falha de tratamentos específicos para determinados perfis de câncer”, comenta
um dos pesquisadores envolvidos na iniciativa, o oncologista Carlos Caldas.
“Mas, para isso, precisamos verificar milhares de amostras de tumores no
microscópio. Com esse processo automatizado, podemos analisar mais de cinco mil
imagens por dia.”
O
programa já foi testado com tumores de duas mil pacientes e se mostrou tão
eficaz quanto os métodos tradicionais. Os cientistas agora planejam repetir os
testes com mais amostras e refinar o programa para detectar outros elementos.
Troca de experiências
A
ideia de usar as ferramentas da astronomia na medicina surgiu depois que
cientistas do grupo participaram de um congresso que reuniu físicos, astrônomos
e cientistas de biomédicas justamente para compartilharem conhecimentos.
Pode
ser difícil de ver semelhanças entre as áreas, mas o líder da pesquisa, o
oncologista Raza Ali, conta que logo de cara soube como aproveitar a expertise
dos colegas astrônomos.
“É
incrível que nosso software usado para procurar planetas que podem
abrigar vida fora do sistema solar possa agora ser usado para ajudar vidas de
pacientes de câncer aqui na Terra”
“Os
astrônomos desenvolveram uma grande caixa de ferramentas de análises de imagens
para diferentes problemas que encontram”, diz. “Eles tipicamente identificam e
descrevem estrelas e planetas, mas se você parar para pensar, esses objetos
são, em certo sentido, parecidos com as células de câncer que estamos
interessados. Eles usam programas para procurar características comuns a esses
objetos em meio a trilhões de astros. Nós fazemos a mesma coisa com as células
de câncer.”
O
astrônomo Nicholas Walton, que ajudou Ali a adaptar o programa de identificação
de astros, se diz satisfeito com a colaboração interdisciplinar. “É incrível
que nosso software usado para procurar planetas que podem abrigar vida
fora do sistema solar possa agora ser usado para ajudar vidas de pacientes de
câncer aqui na Terra.”
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