Agência FAPESP – Pesquisadores do Instituto de Química da
Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Araraquara, desenvolveram um
novo método para medir a concentração de ozônio no ambiente. O ozônio é um
composto tóxico para o homem, plantas e animais, que pode danificar diversos
materiais, como borracha e corantes, e contribuir para o aumento do efeito
estufa.
Portátil,
mais barato e mais fácil de ser utilizado do que outros equipamentos existentes
para essa função, o dispositivo começou a ser desenvolvido durante um projeto de pesquisa, realizado com apoio da FAPESP, e resultou em uma patente, depositada com
auxílio do Programa de Apoio à Propriedade Intelectual (PAPI/Nuplitec), da
FAPESP.
“Realizamos
uma pesquisa sobre sistemas analíticos para determinação de ozônio no ambiente
e vimos que existiam poucos métodos químicos para essa finalidade”, disse
Arnaldo Alves Cardoso, professor do Instituto de Química da Unesp de Araraquara
e autor do projeto, à Agência FAPESP.
“Com
base nessa constatação, buscamos desenvolver, a partir do início de 2000, um
novo método químico para determinação da concentração de ozônio em ambiente. O
método é mais indicado para realizar medidas pontuais em ambientes internos,
por exemplo, para as quais não vale a pena adquirir equipamentos eletrônicos
existentes hoje, que são sofisticados e caros”, disse Cardoso.
O
sensor desenvolvido é baseado na reação do ozônio com o índigo – corante
utilizado na indústria têxtil para tingir tecidos, como o jeans, e na indústria
alimentícia para conferir a cor azul anil a balas, chicletes e sucos em pó –,
que, na presença do composto, se oxida e descolore.
Um
filtro de celulose impregnado com índigo, em formato circular e com apenas 2 cm
de diâmetro, é inserido dentro de uma seringa descartável de plástico com
etilenoglicol – substância que aumenta a umidade do filtro e, dessa forma,
facilita a reação do ozônio com a superfície do material.
A
aspiração do ar por meio da seringa faz com que ozônio presente provoque a
descoloração do índigo contido no filtro de celulose. Dessa forma, quanto maior
a concentração de ozônio na amostra de ar coletada de um determinado ambiente,
mais clara será a tonalidade do papel.
Inicialmente,
o índigo restante ao final da amostragem era extraído e sua cor determinada por
um colorímetro – equipamento que mede a intensidade de cores. Mais recentemente
o método foi adaptado para fazer a leitura diretamente no filtro por meio de
uma escala de 30 tons de azul, elaborada pelo doutorando Gabriel Garcia a
partir de imagens digitalizadas de filtros contendo índigo e que pode ser
impressa em qualquer impressora comercial.
Após
algumas horas de duração do teste, a coloração final do filtro é comparada com
a escala na qual cada intervalo corresponde a uma concentração de,
aproximadamente, 3 ppb (partes por bilhão) de ozônio. Se a diferença entre a
cor inicial e a final do filtro de celulose corresponder a 20 tons da escala,
por exemplo, a concentração de ozônio na amostra de ar coletada será de,
aproximadamente, 60 ppb – medida considerada alta.
“Por
meio da tabela de variações de tons de índigo elaborada pelo Gabriel é possível
fazer comparações visuais para saber qual a concentração de ozônio em um determinado
ambiente”, disse Cardoso.
Comparações de equipamentos
Os
pesquisadores compararam o desempenho do novo método químico com o equipamento
utilizado por órgãos responsáveis pelo monitoramento da qualidade do ar – como
o da Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental (Cetesb), em São Paulo –
para determinar as concentrações de ozônio na atmosfera em ambientes abertos.
Para isso, usaram um equipamento semelhante ao que possuem no Instituto de
Química da Unesp de Araraquara e que foi adquirido com recursos da FAPESP.
Os
experimentos, realizados no campus da Unesp em Araraquara, revelaram que os
resultados das medições feitas com o sensor químico foram muito próximos das
realizadas com o equipamento eletrônico, que custa cerca de US$ 10 mil.
A
diferença entre eles, no entanto, é que enquanto o equipamento eletrônico faz
as análises e indica a concentração de ozônio em tempo real, o sensor químico,
que custa cerca de R$ 400, fornece a concentração média de um determinado dia,
após algumas horas de duração do teste.
“O
sensor que desenvolvemos não substitui totalmente os equipamentos eletrônicos
utilizados para medir concentração de ozônio na atmosfera”, ressalvou Cardoso.
“O
equipamento eletrônico indica a concentração de ozônio no ambiente minuto a
minuto e, dessa forma, possibilita observar variações rápidas. Já o nosso
método permite observar se a concentração de ozônio em um determinado local
está alta ou baixa e saber qual o valor médio”, comparou.
Por
ser uma opção mais barata e portátil, segundo o pesquisador, o sensor pode ser
uma alternativa para monitorar lugares distantes dos grandes centros urbanos –
uma vez que o ozônio está deixando de ser um problema exclusivo das metrópoles
– e ambientes internos, que também passaram a gerar o composto.
Como
o ozônio possui propriedade bactericida, eliminando microrganismos da água e do
ar e compostos orgânicos que geram odores desagradáveis, como o de cigarro, o
gás passou a ser produzido nos últimos anos em uma ampla gama de
eletrodomésticos: purificadores de ar, máquinas de lavar roupas e ventiladores,
além de lâmpadas germicidas. Além disso, vem sendo misturado na água de
piscinas, aquários e utilizado como desodorizante de ambientes e fungicida de
grãos.
Dessa
forma, os ambientes internos passaram a contribuir para aumentar a concentração
e a exposição das pessoas ao gás, que, em ambientes externos, é formado na
atmosfera a partir de reações químicas envolvendo a luz solar, óxidos de
nitrogênio e compostos orgânicos voláteis emitidos na evaporação de combustíveis,
dos escapamentos dos veículos e até mesmo pela vegetação, como florestas de
eucalipto.
“O
grande problema da geração de ozônio em ambientes internos é que ela será
somada à produzida em ambientes externos e potencializará a concentração do gás
no ar. E isso não se aplica só ao caso deste poluente”, afirmou Cardoso.
Falta de legislação
Outro
problema apontado por Cardoso é que, enquanto há uma legislação bastante
rigorosa em cidades como São Paulo para limitar a geração de ozônio em
ambientes externos, de modo a não afetar a qualidade do ar, ainda não existem
normas que regulem a geração do gás tóxico em ambientes fechados, a despeito do
uso “doméstico” cada vez maior do composto.
Além
disso, segundo Cardoso, ainda não se sabe exatamente a quantidade de ozônio
gerada pelos eletrodomésticos geradores do gás e qual a concentração residual
do composto em ambientes fechados após a utilização desses equipamentos.
“A
falta de especificações técnicas desses equipamentos e de uma legislação que
controle a geração de ozônio em ambientes fechados são problemas muito sérios
que precisam ser discutidos”, afirmou.
De
acordo com o pesquisador, os valores-limites de concentração de ozônio em
ambientes fechados devem ser os mesmos estabelecidos pelos órgãos responsáveis
pelo monitoramento da qualidade do ar para ambientes fechados.
No
final de abril, a Cetesb, por exemplo, baixou um decreto estadual que reduziu
de 70 para 50 ppb a concentração máxima tolerável de ozônio na atmosfera do
Estado de São Paulo em um intervalo de 8 horas.
Em
medições realizadas com o sensor químico em Araraquara, no entanto, os
pesquisadores da Unesp detectaram concentrações de ozônio no ar de até 85 ppb e
constataram que a quantidade do gás no ar da região aumenta no meio e no final
do verão e durante o período da queima da cana-de-açúcar. “A queima de biomassa
aumenta a emissão de compostos na atmosfera que favorecem a formação de
ozônio”, explicou Cardoso.
Já
na cidade de São Paulo, que possui a maior frota veicular do país, só em 2012 a
concentração de ozônio na região do Parque do Ibirapuera ultrapassou 36 vezes a
marca de 81 ppb, segundo dados da Cetesb.
“Apesar
de os carros contarem com catalisadores, como a frota aumenta cada vez mais e,
com o passar dos anos, a velocidade média dos veículos vem caindo, está se
emitindo muito mais compostos para a atmosfera na cidade que provocarão a formação
de ozônio”, disse Cardoso.
O
sensor desenvolvido na Unesp já despertou o interesse de algumas empresas que
trabalham com geração de ozônio, mas ainda não está sendo comercializado, em
grande parte por causa da falta de legislação que estabeleça limites de geração
do composto em ambientes internos.
Para
facilitar seu uso em ambientes fechados uma alternativa já desenvolvida é um
sistema em que pequenos filtros impregnados com índigo são colocados dentro de
um recipiente aberto e, após algumas horas, retirados para analisar sua
coloração e medir a concentração de ozônio. Neste caso não é necessária a
utilização de equipamento para aspiração do ar porque o contato do ar ambiente
com o índigo é suficiente para provocar a descoloração.
“O
sensor ainda não foi comercializado para ser aplicado em ambientes fechados por
falta de demanda de mercado. Mas, independentemente disso, temos buscado
desenvolver métodos químicos que façam a determinação de ozônio de forma mais
simples, barata e acessível”, disse Cardoso.
11/07/2013
Por Elton Alisson
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